quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O silêncio que grita!

Algumas vezes o silêncio é assim: cortante, constante, amante e, portanto, pulsante. Representação máxima do que nem a linguagem consegue dizer. Ele é apenas. Nada de imitações e "como se". Antiteticamente, resulta do que se sente, passa pelo grito e diminui hiatos entre sujeitos.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

POEMA DA NECESSIDADE - Carlos Drummond de Andrade

É preciso casar João,
é preciso suportar, Antônio,
é preciso odiar Melquíades
é preciso substituir nós todos.

É preciso salvar o país,
é preciso crer em Deus,
é preciso pagar as dívidas,
é preciso comprar um rádio,
é preciso esquecer fulana.

É preciso estudar volapuque,
é preciso estar sempre bêbado,
é preciso ler Baudelaire,
é preciso colher as flores
de que rezam velhos autores.

É preciso viver com os homens
é preciso não assassiná-los,
é preciso ter mãos pálidas
e anunciar O FIM DO MUNDO.

"A menos que você acredite que macaco pinta, meu bem!"

Bárbaro. Em todos os sentidos possíveis e, para ser mais exata, explorando ao máximo a máxima do Lacan de que o símbolico é dotado de um duplo sentido. Assim me encontro diante de uma frase ilustre que alguém, digamos, da psiquê humana (ou do macaco) falou para alguém que só tinha um questionamento a fazer.

Engraçado mesmo é como ainda as pessoas trazem tanto de seu instinto para o convívio da linguagem. Vejamos: o que diferencia o homem dos animais é a palavra, a possibilidade de tentar expressar por algo, que não é corpóreo, o que penso. No entanto, acho que ainda "alguns" que se dizem entendedores da psiquê conseguem mostrar como "abanar o rabinho" ou "rosnar" são atividades corporais mais interessantes.

Estava bem, concentrada, até que fui tomada pela fala (ou latido) de alguém que se sentiu indignada porque o outro não sabia. Mas, pelo que me lembro, o Lacan sempre deixou claro que o analista deve se colocar no lugar do não-saber. Contradições da prática no pós teoria. Definitivamente, uma barbaridade analítica!

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

INTERNAÇÃO (Ferreira Gullar)

Ele entrava em surto
E o pai o levava de
carro para
a clínica
ali no Humaitá numa
tarde atravessada
de brisas e falou
(depois de meses
trancado no
fundo escuro de
sua alma)
pai,
o vento no rosto
é sonho, sabia?
Teria muito para dizer. Prefiro calar.

Ti/It

“Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida.” (C.Lispector)

A vida sempre nasce com um sim. O problema é que, algumas vezes, as pessoas não têm consciência disso e, preferindo viver mortas, sofrem e se angustiam. Mas o pior do pior são aquelas que são infelizes e forjam uma felicidade só porque há alguma dor psíquica que as impede de chegar a gozar do efetivo desejo que possuem. Dizer sim é mais do que o ato, é a crença de que ele representa o início, as infinitas possibilidades, o mundo que só apresenta uma certeza: o desejo do sujeito.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

"Ultimamente, a gripe suína tomou conta do mundo e o mundo tomou conta da gripe suína que, por sinal, tem um nome muito interessante: Influenza A. Se, por um acaso, a nova doença tratasse de “Influenciar Amor” bem que ela poderia contaminar o mundo inteiro. O que espero fielmente é que algum cientista em sã consciência também revele ao mundo que as pessoas estão infectadas por um vírus bastante ameaçador – a falta de amor. E, o pior é que esse perigoso vírus mata tanto quanto a gripe." (BLOG DA VIVI)

É. O amor. Certamente, eu inventei este vírus em minha vida; deixei que fosse portadora dele e que manifestasse a doença mesmo, para que pudesse refleti-la e para que o objeto refletido pudesse fazer assim com os outros, um processo em cadeia. A Vivi é uma dessas pessoas que amo, uma dessas que refletem amor e que são portadoras do melhor vírus que existe.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Para refletir uma sociedade anti-heróica

“Menino de 12 anos morre ao salvar amigo de seis em Belém
Plantão 04/08 - Jornal Nacional
BELÉM - Um menino de 12 anos foi enterrado nesta terça-feira em Belém, no Pará, como herói. Ele morreu tentando salvar a vida de um amigo. Segundo a polícia, no domingo, três bandidos chegaram nesta rua atirando. Queriam matar um homem que tinha impedido o bando de roubar um celular. Crianças brincavam na rua quando os bandidos começaram a atirar. Ao perceber o perigo, Emerson Gomes, de 12 anos, correu e usou o próprio corpo para proteger um dos amiguinhos, um menino de seis anos. Emerson acabou baleado e morreu.”

Esta é uma história chocante. Digo isto, porque ficamos paralisados diante de uma atitude imediata tomada pelo menino de 12 anos. De fato, é surpreendente essa doação, já que normalmente agimos em benefício próprio.

Trata-se, sobretudo, de uma atitude bastante condizente com as histórias românticas e seus heróis. Afinal, em um universo de pessoas que se dizem românticas, é só assim mesmo que vemos atitudes heróicas: na literatura do século XIX. Aliás, continuam levando, de fato, a sério essa atitude vanguardista de acabar com o que é tradicional e, portanto, deixamos de lado atitudes como esta.

Como uma contradição de valores, a Globo mostrou uma reportagem do ilustre herói Felipe Massa que se recuperava de seu acidente. A verdade é que a matéria foi tão interessante e pareceu tão mais nacional que, enquanto a do menino durara, no máximo, 2 minutos, a do herói automobilístico durou uns 10. Ainda que quantidade não seja sinônimo de qualidade, neste caso, tenho minhas dúvidas. Verdade seja dita, não acho que o telejornalismo global deveria se ausentar das notícias sobre o piloto, embora esteja convicta de que saber “o que ele vai fazer ao chegar ao seu lar depois de sua recuperação” é bastante demais. Mas, não tanto, se lembrarmos que o que dá IBOPE mesmo é estar diante da TV e torcer pelo piloto que ganha milhões e leva, aparentemente, o nome do Brasil financiado por uma empresa vermelhinha de origem italiana. Imagino, até mesmo, a indiganação de José Saramago com o falso uso da cor que tanto movimentou sua vida marxista.

Embora a palavra herói no dicionário tenha como significado “aquele que arrisca a vida pelo dever ou em benefício de outrem” - assim como a atitude do menino- , bem como “indivíduo notabilizado por suas realizações” – assim como a do menino e do F. Massa - , prefiro acreditar que ainda saberemos valorizar, de fato, atitudes dignas de méritos de atitudes pseudo-heróicas. Afinal, a literatura tem muitos heróis que poderiam estar bem encaixados na realidade universal, resolvendo ou, quem sabe, lutando por valores mais humanos e reais, bem distantes do mundo da verossimilhança.

Limpeza da alma!

Abri o Jornal O Globo hoje e me deparei com uma notícia cujo título era "Os espíritos de porco". Conseqüentemente, pensei na sujeira em geral e, mais especificamente, na falta de limpeza da alma.
Lendo a matéria, revivi momentos ímpares de infeliz moradora do Rio de Janeiro que "continua lindo". Pensei, portanto, em situações experienciadas pelo caminhar nas ruas da cidade. O pior é que não adianta pensar em sair de casa sem ter a sujeira a seu lado, pois ela já faz parte do espaço carioca. Inclusive, é estritamente necessário pensar duas, três, "n" vezes antes de escolher, por exemplo, um sapato para a rotina exaustiva do cidadão carioca, afinal, a escolha errada pode trazer alguma doença de pele que, por uma questão óbvia, não é culpa de ninguém. Aliás, nunca é. No entanto, minha imaginação flui e consigo, então, pensar que o agente da falta de limpeza, o FL-09, do Planeta da Sujismundâcia, paira sempre aqui na Terra, mais especificamente no RJ, para zombar dos habitantes daqui.
Depois de 40 anos, a Comlurb resolve fazer uma campanha com seu personagem já conhecido dos cariocas mais experientes: o Sujismundo. Logicamente, este bonequinho terá a intenção de conscientizar o povo da metrópole para este problema. Uma contradição: um povo que se sente bastante desenvolvido, independente e adulto, carece de algo bastante infantil - o momento em que as histórias em quadrinhos darão conta de educar, ludicamente, o povão já tão educado que prefere voltar-se para si e esquecer o outro. Quem sabe, assim, esta prática pedagógica não resolve os problemas do Rio?!? Mas, a educação já é tema para uma outra conversa.

Saiba, o ludismo é a solução!

Ouvindo a música “Saiba” do Arnaldo Antunes, na voz de Adriana Calcanhotto, notei como ela tem um saudosismo gostoso que nos embala, musicalmente, como nenéns. Sinto-me diante de uma canção que nos pega no colo e nos transporta para o mundo do imaginário infantil - um lugar cheio de histórias a serem contadas, a partir de mundos criados.

Notamos uma voz poética suave que se torna forte ao listar o nome de figuras célebres. Fica até difícil criar em nossa mente a imagem desses personagens diante de um tom tão delicado. Cabe lembrar, no entanto, que delicadeza e força não são palavras opostas. Acho, inclusive, que quanto maior a delicadeza, maior a força, maior a possibilidade do ludismo, que deveria ser tão buscado por homens vigorosos como os da música.