sexta-feira, 24 de julho de 2009

Travessia

Dois bancos no jardim à espera de ocupação. Mais ou menos assim, a menina Joana disse ao seu regador de estimação. Era um regador bonito, embora não suprisse tanto a necessidade daquela que queria mesmo era conversar, apenas falar e, para isso, aquele objeto servia. Descobrira que ele era experiente e que já vivenciara situações muito inusitadas em sua vida. Por isso gostava dele. Diante da realidade estranha daquele objeto bonito-experiente, Joana pensou em torná-lo mais do que um objeto, mas O objeto. Afinal, na falta d’ O objeto, o objeto servia. No lugar do que nunca houve, colocar um regador poderia ser interessante, ou proveitoso.
Passaram dias e Joana intensificava sua relação com ele. Deixara de olhar o jardim e também os bancos. Começou a perceber que sua vida era mais agradável ao lado do regador. Logicamente, ela possuía outros objetos, mas este era aquele do qual ela mais gostava. Percebeu mais: estar longe dele era estar como aqueles bancos, à espera de ocupação. Pelo menos, o regador a ocupava. Era só colocar mais água para molhar as plantas que lá estava novamente o objeto diante daquele sujeito. Ela colocava sempre água, porque sabia que seria assim o momento de conversar com ele.
A conversa foi se estendendo e, por descuido, a menina deixara o regador cair. Quebrou-o e angustiou-se porque sabia que, mesmo sendo algo sem-vida, era ele quem supria suas necessidades. Mas, devido a sua condição objetal, consertou-o e pôs-se novamente, como num ritual, a regar o jardim. A prática continuava, embora aquela cola visível a incomodasse. Mas, era possível superar incômodos, consertos e quebras. O que não podia era voltar a se sentir sozinha. E não se sentiu.
No jardim, finalmente um menino franzino sentou em um dos bancos. Acompanhada de seu regador, sentou-se no outro banco e deixou que o silêncio falasse por eles.

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